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Foto do escritorGabriel Noboru Ishida

Sushi brasileiro: A arte de comer o mundo cru e rir dos limites

Atualizado: 29 de out.


 Já faz anos que o sushi foi elevado ao status de obra de arte. Aliás, tudo no Japão em geral praticamente surgiu assim. E por ser japonês em sua origem, exige contemplação, respeito às tradições, perfeição na execução e todos os elementos necessários para que seja identificado como típico do país do Sol nascente.

Já no Brasil, o planeta do incremento ousado e sem limites, o sushi encontrou horizontes intermináveis. Sabores que por aqui nos enchem, por lá são considerados pura heresia. Há sutileza e exoticidade. É absolutamente um símbolo de sofisticação.

Esse bichinho não se faz de qualquer forma, nem com qualquer ingrediente. Por isso, é caro. Porque ingredientes bons e sushimans decentes não são baratos (com frequencia eles vêm do nordeste!). Além disso, o ambiente é sempre sofisticado. Investimento caro de novo...

E como tudo que é brasileiro vira piada e alegria, barato sem ser barato, ganha passaporte para ser vulgar sem ser, pisa no sambódromo mas não vira funkeira e pisa na cara do croissant sem recheio sem dó... temos assim, a expressão - como reza a já conhecida piada: "Moço, você vai me levar pra comer sushi? Porque você está querendo me.... "

 

A Obra de Arte e o Poder dos Sentidos


Quem acha que obra de arte é algo incrível e meio fora do dia a dia, não parou para pensar que a gastronomia é a maior de todas. Mexe com todos os sentidos: tato, paladar, visão, olfato, inclusive com as terminações nervosas em torno de temperatura, e com a audição - ovas de peixe fazem barulhinhos deliciosos e o pepino também, envoltos no silêncio da carne crua e dos cremes heréticos que o brasileiro enfiou no meio do nori.

O cheiro de mar nos transporta para o feminino comível no bom sentido, sem que possamos perceber. O corte, replica um peixe em fatias, sua coluna e tripas, seus músculos, pele... é uma abstração incrível. E depois, uma composição erótica, com várias texturas, cheiros e sabores, estimula quase todos os sentidos e células gustativas ao mesmo tempo. Por isso, é realmente, utilizado como forração para noites mais calientes.

Some-se a isso, a maravilhosa esfera do efêmero. Se há algo que é realmente oriental, é a arte em torno do efêmero, desde mosaicos tibetanos de areia colorida até o uramaki mais caro que se possa encontrar. Efêmero, é o tempo de feriados no Japão.


No Brasil - mix de misturas


Para quem assistiu Blade Runner - um dos filmes que dominam não só o pop mas também o universo cult - vale citar o personagem oficial de polícia Gaff, fazedor de origamis junguianos. Ele, com sua pose que emana pura nobreza, kimonos em forma de terno e uma pitada de gigolô, é o verdadeiro futurista brasileiro das ruas. O Cyberpunk misturado com o street fashion. Além disso, nada mais cult e contemporâneo que saber idiomas - afinal de contas, qualquer roedor agora pode usar tradutor em tempo real. Nada nobre nisso. Saber idiomas é uma arte. Ele, o Gaff, que misturava chinês, japonês, inglês e outras gírias, é como o sushi brasileiro: atropela o convencional e o medo de que as Ameindas digam "ain, mas isso está erraidou. U certuh é aissieimm". Tem estilo, tem sabor, tem visual, tem ritmo e um enorme quadrante cultural cheio de temperos que apontam para a mesma direção. São tantos vetores, que parece até o kit de dragons da Starship da SpaceX, fumegando cultura.



Puro suquinho de Brasil...

Heresia pura!

Porn food, para falar em portug... digo, inglês claro.


A Arte como Conceito e Estilo de Vida


No Japão, o sushi surgiu naturalmente, se vestiu naturalmente, e se sustentou como um típico japonês, cumprindo sua função e seu lugar no mundo. Imutável. E t e r n a m e n t e imutável. Conservar peixe e servir como invólucro de transporte, além de ser conveniente para os hashis - pauzinhos japoneses de comer.

Mas no Brasil... ah, o Brasil... lugarzinho engraçado e debochado esse, não? Quem é Marcel Duchamp na fila do pão, diante do sushi e da pizza brasileira? E das versões de músicas que fazemos? Nada. Um tiozinho que fez duas ou três coisas interessantes naquela época. Mas como dizem, o Brasil e sua culinária tentam causar uma crise diplomática internacional - e isso é arte.

Todas as camadas de significado que se possa utilizar para rechear um sushi, em algum momento, surgirão nesse lugar caótico. E se você quer se divertir, e levar ela de sobremesa no fim da noite, leve antes para comer sushi - saiba algumas palavras em japonês, em inglês, em chinês, em tailandês e conte curiosidades sobre... ah, não sei. Eu sou uma pessoa simples. Mas fica aí a dica!

Apenas se lembre: o cru, é sexy. É sexual, é cult, é cool, é pop e é quase mitológico. Vista-se com estilo. Não dá para comer sushi com bermuda de tactel e chinelo né? Bom, no Brasil dá sim. Ninguém liga. É lanche.


O Cru como Símbolo de Civilidade e Selvageria

 

Aos olhos ocidentais, o sushi brota como uma forma de selvageria civilizada, uma expressão que jorra natureza em seu estado mais puro e, ao mesmo tempo, transforma em um gesto de extremo refinamento, a arte de matar. É, sim, um estado de arte: a morte e matar, nesse caso. Coisa de samurai, sabe, o tal do bushidô. O peixe cru, o cheiro de sangue do atum, a carne drenada da tilápia... as ovas vivas, tudo quase vivo. É selvagem, é civilizado, é a volta de 360° que o meu pastor falou que a gente ia dar na vida... hoje eu entendo!


Oscilando entre o sereno e o provocante, o selvagem hétero, sexual e bruto, e o delicado corte do toque mais gay que existe para a perfeição da culinária chic, o exótico é a quebra de coerência do que, em geral, se entende por padrão cultural de alimento. Enquanto na Europa estavam escalonando armas em forma de talheres sobre a mesa, para comer tudo o mais distante possível de sua origem, na Ásia estavam utilizando pauzinhos com uma habilidade que beira o cômico e o debochado, para segurar pedacinhos de obra de arte e devorar com uma enorme boca de mangá, misturas extraordinárias. Bem, não tão extraordinárias quanto as versões desenvolvidas na Califórnia e principalmente no Brasil. Não se enganem: o Brasil é melhor que todos esses juntos. Exceto para fazer celular. Isso eu não discuto.




 

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